13 de abril de 2023

A Idade Biológica de Glória Maria

A morte da jornalista Gloria Maria trouxe à tona uma polêmica sobre a idade cronológica dela. As atitudes e a aparência rejuvenescida de Glória a colocam junto a um grupo de pessoas cuja idade biológica é provavelmente mais nova do que a idade cronológica. Saber a idade cronológica é bem fácil, mas nos últimos anos pesquisadores tem se debruçado para determinar a idade biológica. Existem ao menos nove mecanismos celulares que a influenciam, e um dos mais importantes é a epigenética. O DNA de uma pessoa pouco muda durante a vida, mas as experiências e o meio ambiente podem influenciar a atuação de nossos genes. Alterar a produção das proteínas sem precisar alterar a estrutura dos genes, é o princípio básico da epigenética, conceito conhecido há mais de 80 anos, mas que ganhou força só recentemente, com o avanço do conhecimento do Epigenoma humano, a coleção de todas as marcas epigenéticas em uma única célula. Hoje é possível através de exames nas células da saliva ou sangue, analisar as alterações de marcas epigenéticas, e estimar idade biológica. Historicamente o envelhecimento foi relacionado com o acúmulo progressivo de mutações no DNA, mas uma teoria alternativa propõe que é o reparo natural destas mutações que causa envelhecimento, ao interferir nas instruções epigenéticas. Envelhecimento não seria apenas um problema do hardware (Genoma), mas sim do software (Epigenoma), e talvez seja possível reprogramar estas marcas epigenéticas como reiniciamos nosso computador. A capacidade de estabelecer a idade biológica tem permitido avaliar como mudanças de hábitos e medicamentos podem interferir no processo considerado até então intocável pela ciência. Se tornou famoso o caso de Bryan Johnson, que com a ajuda de 30 profissionais de saúde conseguiu reduzir sua idade biológica em 5 anos. Dois estudos que acabam de ser publicados, realizados em ratos, apoiam a teoria do envelhecimento pela perda das marcas epigenéticas. Ambos fizeram uso dos “fatores de Yamanaka”, um pequeno conjunto de proteínas que tem o poder de transformar uma célula já madura em uma célula-tronco, sem alterar os genes. Em um dos estudos, ainda não revisado por pares, aplicaram “fatores de Yamanaka” às células no intuito de prolongar o tempo final de vida de ratos, que vivem em média 129 semanas. Os ratos receberam o coquetel rejuvenescedor já com 124 semanas e viveram em média 142 semanas. Em um segundo estudo, feito por pesquisadores de Harvard e publicado na “Cell”, envelheceram ratos provocando quebras no DNA, porém sem afetar genes, e demonstraram que processos epigenéticos foram rompidos; então aplicaram “fatores de Yamanaka” e reverteram as marcas epigenéticas. Mas os dois trabalhos têm limitações. Persistem dúvidas se as alterações nas marcas epigenéticas podem ser apenas a consequência e não a causa do envelhecimento e rejuvenescimento. Existem também questões de segurança, pois o grande perigo dos “fatores de Yamanaka” é gerar células cancerosas, ironicamente um dos maiores objetivos a ser evitado com as técnicas de rejuvenescimento. Além disso, técnicas que se propõem a rejuvenescer o corpo todo esbarram nas evidências de que cada órgão seja afetado de forma diferente pelo meio ambiente e pelos anos de vida, e, portanto, diferentes órgãos talvez tenham diferentes idades biológicas, o que ajudaria a tentar explicar o câncer de pulmão em uma pessoa rejuvenescida como Gloria Maria. A busca do “Elixir da longa vida” é milenar e envelhecer ainda é inevitável. Mas o avanço da medicina regenerativa e da genética de precisão nos fazem acreditar que talvez a primeira pessoa a viver até os 150 anos já tenha nascido. Gloria Maria, sempre à frente de nossa época, valorizava o que agora se sabe ser o mais importante; a idade biológica!

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